Glória W. de
Oliveira Souza[1]
Ao imputar ao sistema visual urbano o caráter de poluente, o fazem a partir do conceito genérico de poluição. Mas a definição para este termo é a “presença ou introdução, no meio ambiente, de substâncias nocivas à saúde humana, a outros animais e às plantas, ou que prejudicam o equilíbrio ecológico”, já que poluir, que provém do latim polluere, de acordo com Ferreira (1975)[2], significa “sujar, corromper, tornando prejudicial à saúde”. Ao que consta, o acesso do ser humano a símbolos, formas, ícones e cores na urbe não têm provocado qualquer dano biopsíquico. Para qualquer um dos sentidos, e muito menos para a visão, porque esse órgão não funciona de forma isolada dos demais sentidos, ainda mais que “o cérebro é o maior aliado da visão. São os olhos que veem, mas quem enxerga mesmo é o cérebro”[3]. Portanto, a visibilidade – qualidade de visível, que provém do latim visible – diz respeito ao que se pode ver, de forma clara, aparente, perceptível.
Para que as mensagens do
ambiente urbano possam ser percebidas há que compreender como ocorre a
percepção. Embora no uso moderno o termo percepção geralmente se refira a
processos sensoriais, como a visão e a audição, Descartes reserva o verbo
‘perceber’ para designar a apreensão puramente mental do intelecto, como na
célebre regra: “tudo o que clara e distintamente percebo é verdadeiro”
(Cottingham, 1995)[4].
Assim, percepção pode ser diferenciada da sensação, a qual diz respeito à
estimulação dos órgãos sensoriais e pode estar restrita aos primeiros estágios
de processamento das informações recebidas“ (Stratton; Hayes, 1994)[5].
Para esses autores, a percepção compreende várias áreas, como a percepção
visual, percepção da pessoa, percepção auditiva, bem como a percepção “de
outras formas de informações, como as relacionadas ao olfato, ao tato, à
gustação e à dor”. Isto é, todos os sentidos estão envolvidos. Carneiro e
Ribeiro[6]
lembram que os homens possuem insuficiência perceptiva. “Não podem apreender do
real nada mais que suas impressões. Deste modo, a conduta humana oscila entre
matéria e memória, percepção e lembrança”. Domingues[7]
adiciona que “o cérebro reptiliano controla os instintos (...), mas como temos
que ‘parecer’ racionais, o córtex, senhor da razão, mais que depressa cria um
motivo racional”. Assis Brasil (1984)[8]
complementa ao indicar que perceber “é conhecer, pelos sentidos, objetos e
situações. Para tanto é necessário que o objeto esteja próximo, quer no espaço
ou no tempo, ou que se tenha acesso a ele diretamente”.
E a comunicação urbana,
principalmente nas grandes metrópoles, contém esse caráter de proximidade,
provocando no receptor da urbe uma percepção estética, já que esta “é
pura percepção, compondo-se como forma privilegiada de apreensão de uma
presença. Não se visa, através dela, a práxis, configurando-se, ao
contrário, como forma desinteressada da confrontação com o objeto” (Penna, apud
Assis Brasil, 1984), porque a operação de perceber tem a característica da
informação limitada e sempre se percebe a partir de uma perspectiva. E essa
perspectiva é a visualidade – que tem sua origem no latim visualitate e aponta
para o aspecto cambiante, como miragem – onde a publicidade, no conceito de
tornar-se pública, conforme Habermas (apud Mattelart, 2003)[9],
que “se define como pondo à disposição a opinião pública os elementos de
informação que dizem respeito ao interesse geral”. Habermas aponta ainda que
sua intrusão na esfera da produção cultural transforma as formas de comunicação
cada vez mais inspiradas em um modelo comercial de ‘fabricação da opinião’. E
assim tem sido feito no caso da poluição visual.
continua...
[1] Originalmente divulgado por ortonímia (nome que corresponde ao autor efetivo da
obra quando um escritor não assina os seus trabalhos
sob pseudônimo ou heterônimo, ou seja, o autor possui existência
real) em forma de paper apresentado no 1. Simpósio sobre Comunicação
Visual Urbana, realizado no dia 25 de outubro de 2005, em São Paulo, promovido
pela FAUUSP. Disponível em
http://www.usp.br/fau/depprojeto/labim/simposio/PAPERS/SCV2VI07.htm
[2] FERREIRA, A. B. de H. Novo Dicionário da Língua Portuguesa.
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1975.
[3] REDE GLOBO. Percepção do mundo.
Fantástico. Disponível em <http://fantastico.globo.com/Jornalismo/Fantastico/0,,AA1028495-4687,00.html>.
Acesso em 28 set 2005.
[4] COTTINGHAM, J. Dicionário Descartes.
Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1995.
[5] STRATTON; P.;HAYES, N. Dicionário
de psicologia. São Paulo, Pioneira, 1994.
[6] CARNEIRO, L. de J.; RIBEIRO,
S. O. Da seleção das imagens: algumas
palavras sobre a percepção em Bergson. Disponível em <http://www.ifcs.ufrj.br/hi/comen3.htm>.
Acessado em 23 jun. 2005.
[7] DOMINGUES, S. L. O marketing do inconsciente.
Disponível em <http://www.comunique-se.com.br/index.asp?p=Conteudo/NewsShow.asp&p2=idnot%3D23467%26Editoria%3D237%26Op2%3D1%26Op3%3D0%26pid%3D5623050169%26fnt%3Dfntnl>.
Acesso em 12 abr. 2000.
[8] ASSIS BRASIL. Dicionário do
conhecimento estético. Rio de Janeiro: Ediouro, 1984.
[9] MATTELART, A.; MATTELART, M. História das teorias da comunicação. São Paulo: Loyola, 2003.
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